Negociações em meio ao conflito
A Federação Internacional de Esports (IESF) está em negociações com a cidade de Lviv, na Ucrânia, para sediar seu principal evento, o Campeonato Mundial de Esports (WEC 2025), ainda este ano. Fontes próximas ao assunto confirmaram que a cidade já fez um pagamento preliminar de US$ 1 milhão como parte de um acordo potencial de US$ 10 milhões. No entanto, esse acordo traz condições significativas devido à guerra em curso entre Ucrânia e Rússia, levantando questões críticas sobre segurança e a percepção de realizar um evento desse porte durante uma crise nacional.
Em uma reunião do conselho em março, presidida pelo presidente da IESF, o príncipe Faisal bin Bandar bin Sultan Al Saud, foi realizada uma votação formal para sediar o campeonato de 2025 em Lviv, a sétima maior cidade da Ucrânia, situada a aproximadamente 70 quilômetros da fronteira com a Polônia. Embora Lviv esteja relativamente isolada das zonas de conflito, a logística para viagens dos participantes exigiria principalmente trânsito pela vizinha Polônia.
Desafios financeiros e políticos
Fontes indicam que a IESF precisava urgentemente da injeção financeira desse acordo, tendo esgotado suas reservas em março, o que resultou em demissões significativas de funcionários. Os fundos de Lviv, complementados por um acordo de publicidade de US$ 250.000 com uma empresa não identificada da Indonésia, são cruciais para a viabilidade operacional da organização no próximo ano.
No entanto, obstáculos significativos permanecem. O contrato exige um cessar-fogo mínimo de três meses antes do campeonato para garantir a segurança dos participantes. Além disso, a IESF tem planos de contingência para adiar o acordo com Lviv para 2026 se surgir uma alternativa mais vantajosa para 2025.
Políticos locais também enfrentarão escrutínio sobre o gasto de US$ 10 milhões durante um período de austeridade em tempo de guerra. Essa preocupação pode ressoar particularmente com observadores dos EUA, que podem ver o evento como "gasto desperdiçado" enquanto o país recebe ajuda militar e humanitária internacional em grande escala (confira este relatório recente do Council on Foreign Relations).
Controvérsias fiscais e respostas da IESF
A IESF também está lidando com as consequências do WEC 2024 realizado na Arábia Saudita. Federações membros, notadamente a de Portugal, criticaram a IESF por retenções fiscais inesperadas, alegando má gestão e falta de transparência. Portugal afirmou ter recebido apenas 85% de seus ganhos de US$ 700.000 devido a uma retenção de 15% pelo governo saudita, aplicada de forma inconsistente entre as federações membros.
Em resposta, a IESF enfatizou um esforço contínuo de reestruturação para melhorar a supervisão financeira e a eficiência organizacional. A federação afirma ter estabilizado sua situação financeira após investimentos recentes e acordos de patrocínio.
Em comunicado ao The Esports Advocate, a federação declarou: "O Conselho da IESF está unido e estratégico em sua tomada de decisões. Nosso foco permanece em expandir oportunidades globais para esports, incluindo o apoio a regiões onde os esports podem desempenhar um papel na resiliência e unidade. Toda decisão é baseada em um equilíbrio entre segurança, oportunidade e desenvolvimento de longo prazo".
Impacto nos atletas e equipes participantes
Enquanto as negociações continuam, jogadores e equipes de esports enfrentam incertezas significativas. Muitos atletas expressaram preocupações sobre a segurança pessoal em uma zona de conflito, mesmo que Lviv esteja relativamente segura. "É difícil focar no treinamento quando você não sabe se o torneio vai acontecer ou se será seguro viajar", compartilhou um jogador profissional que pediu anonimato. "Para muitos de nós, este é nosso sustento, mas também não queremos arriscar nossas vidas."
Equipes menores, especialmente de países em desenvolvimento, enfrentam desafios adicionais. Os custos de viagem e hospedagem já são altos para eventos internacionais, e a localização incomum pode aumentar ainda mais essas despesas. Algumas federações nacionais estão considerando boicotar o evento se ele for realizado na Ucrânia, citando preocupações com segurança e custos proibitivos.
O papel geopolítico dos esports
Analistas apontam que a decisão da IESF tem implicações que vão além do mundo dos jogos. "Esta pode ser uma tentativa de usar os esports como ferramenta de soft power", observa Dra. Marina Kovalenko, especialista em relações internacionais da Universidade de Kyiv. "Ao realizar um evento global em uma zona de guerra, a Ucrânia poderia projetar uma imagem de normalidade e resiliência, enquanto a IESF ganharia visibilidade como organização disposta a correr riscos."
No entanto, essa estratégia traz riscos consideráveis. Se ocorrerem incidentes de segurança ou se o evento for percebido como exploração de uma crise humanitária, a reputação tanto da IESF quanto da Ucrânia poderia ser prejudicada. Alguns membros da comunidade de esports já expressaram desconforto com a possibilidade do torneio ser usado como propaganda política.
Precedentes históricos e comparações
Esta não é a primeira vez que eventos esportivos ocorrem em regiões instáveis. Os Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro aconteceram durante uma crise política e econômica no Brasil, enquanto o Mundial de Futebol de 2022 no Catar gerou debates sobre direitos humanos. No entanto, realizar um evento durante uma guerra ativa seria sem precedentes no mundo dos esports.
"Há uma diferença fundamental entre instabilidade política e conflito armado", argumenta Thomas Müller, ex-organizador de torneios de esports. "Nos outros casos, os riscos eram principalmente logísticos ou de imagem. Aqui estamos falando de segurança física real. A IESF precisará de protocolos de emergência muito mais robustos do que o normal."
Alguns especialistas sugerem que a pandemia pode ter criado um falso senso de segurança. "Organizadores se acostumaram a lidar com crises imprevisíveis durante o COVID", observa Müller. "Mas uma guerra é fundamentalmente diferente - não há garantias de que voos continuarão operando ou que a infraestrutura permanecerá intacta."
Reações da comunidade de esports
A notícia gerou debates acalorados nas redes sociais e fóruns especializados. Enquanto alguns apoiaram a decisão como uma forma de apoiar a Ucrânia, outros criticaram o que veem como uma decisão arriscada e potencialmente exploratória. "Isso não é sobre apoiar a Ucrânia, é sobre dinheiro", escreveu um usuário no Reddit. "Se realmente quisessem ajudar, doariam parte dos lucros para vítimas da guerra."
Patrocinadores também estão em uma posição delicada. Marcas globais que tradicionalmente apoiam eventos de esports agora devem pesar os riscos de associar sua imagem a um evento em uma zona de conflito. Fontes indicam que algumas empresas já estão reconsiderando seus compromissos financeiros, enquanto outras veem uma oportunidade para posicionamento de marca como apoiadoras da resistência ucraniana.
Com informações do: The Esports Advocate